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Finanças Pessoais: Dívidas: como zerar uma a uma pt.8

  • Foto do escritor: Felipe Picanço
    Felipe Picanço
  • 11 de set.
  • 10 min de leitura

Olá, pessoal! Tudo bem? Como é que vocês estão?

A aula de agora vai abordar um tema que, acredito, é a parte mais delicada das nossas finanças: as dívidas. É um assunto que, sei, gera dor de cabeça e desconforto ao ser tratado. Mas, gente, a dívida na nossa vida é como uma ferida aberta: ela precisa ser tratada. Vai ser dolorido, sim, mas é o único caminho para que a gente possa, de fato, alcançar a tão sonhada independência financeira.


Imagino que esta aula possa ser uma das mais esperadas pela maioria de vocês, e há uma razão para isso. Infelizmente, o perfil do brasileiro hoje é de endividamento. Pesquisas recentes de grandes instituições financeiras como Serasa e SPC mostram que 78% das famílias brasileiras estão endividadas. E o pior: dentro desse percentual, uma grande parte não consegue pagar suas dívidas. Então, se 78% do Brasil tem esse problema, partimos do princípio de que muitos de vocês também podem ter alguma situação a solucionar na sua vida financeira, mesmo que sejam pequenas dívidas que, se não cuidadas, podem se tornar grandes.


Essa dívida no Brasil, hoje, se manifesta de forma muito comum no rotativo do cartão de crédito. Sabe aquela pessoa que usa o cartão, mas não consegue ter renda suficiente para pagar o valor total da fatura? O juro do cartão de crédito, como a maioria deve saber, é super agressivo, um dos maiores do mercado. E como está ligado a um consumo direto, você vai parcelando mês após mês, e essa ferida não estanca. Diferente de financiamentos, que são compromissos menos flexíveis, o cartão de crédito e o cheque especial são como uma torneira que você pode abrir e fechar a qualquer momento, e isso vira um ciclo vicioso. Sim, isso engloba todas as faixas etárias, do mais jovem ao mais maduro, todos têm um nível de endividamento altíssimo.


Meu objetivo aqui é que a gente não faça parte dessa triste estatística. A aula de hoje visa encontrar uma maneira de organizar nossas dívidas. Vamos conseguir identificar dentro do nosso orçamento quantas dívidas temos, qual o valor de cada uma delas e como vamos planejar o pagamento. É importante saber que o valor desses juros que pagamos mensalmente vai precisar fazer parte da nossa despesa, do nosso orçamento, até que a gente resolva o problema.


Será como entrar em uma guerra: teremos que nos colocar no meio das trincheiras para resolver isso. Vamos precisar assumir hábitos e comportamentos que não estávamos acostumados. Quando tratamos de finanças pessoais, o ideal é que nosso estilo de vida esteja sempre um pouco abaixo do nosso nível de receitas. Se você ganha R$ 10.000, o ideal seria viver com R$ 8.000 ou menos. Mas se você está endividado, esses R$ 8.000 de despesa não servem mais. Você vai precisar baixar seu patamar para R$ 6.000 ou R$ 5.000, e viver com um nível de renda bem abaixo, porque são medidas extraordinárias que precisam ser tomadas. Dependendo do plano que você monte, isso pode durar apenas três meses, seis meses ou um ano. O importante é identificar o perfil da sua dívida e ver como se adequar para que ela deixe de ser um problema o quanto antes.


Antes de irmos direto para a prática da construção da planilha, quero compartilhar alguns conceitos importantes. Eu sempre faço uma analogia que gosto muito: você trabalha oito a doze horas por dia, certo? Já parou para imaginar que, de repente, metade da sua vida está comprometida com a dívida? Se você trabalha oito horas, quatro dessas horas você está trabalhando só para pagar uma dívida. Isso não é apenas desgastante física e mentalmente; é o resultado de meses passados onde você consumiu muito mais do que deveria.


A dívida se forma através disso: assumir um perfil de consumo além da sua capacidade financeira. Podemos fazer um paralelo com a alimentação: se passarmos o ano inteiro comendo muito mais do que nosso corpo gasta de calorias, obviamente vamos ganhar gordura. A situação das dívidas é a mesma. Você passou muito tempo obtendo renda através de financiamento ou crédito, gastou mais do que devia, e isso gerou uma \"gordura\" que é a dívida. Para tirar essa gordura agora e construir um corpo financeiro mais saudável, você vai precisar passar por períodos de déficit. Seja ele calórico na alimentação, ou de consumo nas finanças. Você vai precisar tomar medidas extraordinárias para se recolocar na rota da independência financeira.


Meu único objetivo aqui, desde a primeira aula, é que a gente possa entrar junto nesse caminho. Para um, o valor da independência será um milhão; para outro, duzentos mil. Mas a gente precisa chegar lá. Para isso, vamos ter que observar nosso orçamento e tomar medidas diretas. Isso pode incluir vender o carro, morar com alguém para reduzir o aluguel, cortar bruscamente o consumo de alimentação na rua, ou abrir mão de uma viagem.


Entre tudo que temos que abrir mão agora, a única coisa que você não pode abrir mão é da sua saúde física e mental. Não corte a academia, não corte a terapia, não corte as consultas médicas. Não corte seu bem-estar. Mas todo o restante, você precisa fazer uma reavaliação muito cirúrgica do que vai fazer daqui para frente na sua vida.


Essa aula tem uma motivação especial para mim. Faz parte do meu trabalho como analista de investimentos em um fundo de previdência. Esse fundo oferece a possibilidade da pessoa contribuir com parte do salário para a gente administrar e investir para a aposentadoria. Um dos benefícios que essas pessoas têm é que elas podem obter empréstimos conosco, usando o saldo que acumularam. Por exemplo, se uma pessoa contribuiu por cinco anos e juntou R$ 50.000, ela pode pegar um empréstimo de até R$ 50.000 conosco. Como o valor já está guardado, temos uma garantia, o que reduz nosso risco de crédito.


Semestralmente, preciso fazer uma revisão das taxas de juros que cobramos, para que sejam justas. Para isso, comparo todas as taxas cobradas de empréstimos e financiamentos aqui no Brasil. Faço um ranking de juros: cheque especial, rotativo de cartão de crédito, crédito consignado, crédito consignado do INSS, etc. A partir disso, vejo qual taxa devemos cobrar para que seja mais vantajoso pegar o empréstimo conosco do que ir ao banco ou ficar girando crédito mês após mês. Tenho essas informações guardadas, e sei o quanto é impactante sofrer mensalmente a cobrança de juros de 10% a 20% ao mês. Isso deteriora a vida, vira uma bola de neve. Essa ferida não para de sangrar até que você esteja em uma situação muito pior. Além disso, as dívidas são um dos principais direcionadores de problemas psicológicos em todo o mundo. Desencadeiam diversos outros problemas, pois a parte financeira atinge a parte mental e, em algum momento, a parte física. Ficamos doentes ao nos ver presos nesse emaranhado de valores negativos na conta.


Infelizmente, quase 30% do Brasil funciona assim. A única coisa que posso fazer é trazer o conhecimento sobre como organizar e resolver isso. Tenho para mim que muitas pessoas se endividam e não conseguem pagar por falta de organização. A pessoa não tem noção do tamanho e da quantidade de suas dívidas. Quando ela não consegue ver na sua frente, estruturado, o quanto tem que pagar esse mês, o quanto falta e quando isso vai zerar na sua vida, ela não consegue agir. Vira uma procrastinação.


Acompanhei muito isso quando trabalhei em um banco, com produtos bancários, especialmente empréstimos e financiamentos. Lá, classificávamos os clientes por crédito e eu conseguia enxergar o perfil de cada um. Uma das coisas mais interessantes era o que chamávamos de Crédito Unificado. Era para pessoas que tinham problemas com financiamento de casa, carro, cheque especial e cartão de crédito atrasado. A gente unificava todas essas dívidas em uma só parcela. Em vez de pagar juros de 12% em um, 15% em outro e 20% no cheque especial, a gente conseguia unificar para que a pessoa matasse a dívida de uma vez só, com uma taxa de juros menor (por exemplo, reduzir de uma média de 20% para 12%). Qualquer redução nesse momento é válida!


Então, no final da nossa construção, vale a pena você fazer contato com o banco, com a sua casa de crédito, com SPC, Serasa, e tentar renegociar todos esses valores.

Vamos dar prosseguimento à nossa jornada pelas planilhas! Vamos construir uma nova guia, dedicada exclusivamente às dívidas. A ideia é que, uma vez que tivermos uma noção exata do quanto pagamos de juros por mês, possamos transportar esse valor para o nosso orçamento, criando uma linha de "despesa financeira" ou "juros e amortização”, como preferirem classificar. O mais importante é termos uma foto clara do nosso perfil de endividamento.


Existe uma história interessante, presente em praticamente todos os livros sobre a história do dinheiro e da economia, que remonta a tempos muito antigos, antes de Cristo. Em civilizações como a Mesopotâmia, o Império Romano e a Grécia Antiga, era comum que cidadãos que não possuíam recursos para comprar terras ou iniciar plantações recorressem aos governos para obter dinheiro. Se essa pessoa não conseguisse pagar o recurso obtido, ela acabava se tornando escrava daquele governo. Em alguns casos, dependendo do nível da dívida, a família inteira poderia se tornar escrava, e esse compromisso só se zerava quando a pessoa trabalhasse o suficiente para pagar o valor correspondente à dívida.


Graças a Deus, hoje não somos mais escravos literais, mas a dívida ainda tem um pouco desse conceito: você se torna "escravo do dinheiro", preso a um compromisso de pagar um valor que não é seu. Você deve aquilo a alguém. É um problema sério, pois você fica refém da dívida. A única forma de começar a organizar isso e retomar o controle é através desta planilha que vamos construir agora.


Construindo a Planilha de Dívidas

Primeiro, vamos criar uma nova aba em nossa planilha e chamá-la de "Dívidas".

Agora, vamos montar as colunas. Elas nos ajudarão a organizar todas as informações importantes sobre cada dívida. Sugiro as seguintes:


  • Dívida: O nome ou tipo da dívida.

  • Credor: A instituição ou pessoa para quem você deve.

  • Taxa de Juros (ao Mês): A taxa de juros mensal cobrada.

  • Taxa de Juros (ao Ano): A taxa de juros anual correspondente.

  • Valor da Prestação: O valor da parcela mensal que você precisa pagar.

  • Valor em Atraso: Se houver algum valor vencido e não pago.

  • Valor a Pagar: O saldo total que ainda resta para quitar a dívida.

  • Total Contratado: O valor original total da dívida.


Sintam-se à vontade para organizar e colorir as células da forma que acharem mais útil. O importante é que a planilha seja funcional para vocês.


Na coluna Dívida, você vai especificar o tipo de dívida: se é de cartão de crédito (de qual banco?), cheque especial, financiamento de carro, financiamento de imóvel, empréstimo com familiar, etc. Vamos usar um perfil com cinco dívidas, uma de cada tipo, para que o exemplo seja bem palpável.


  1. Cheque Especial: Vamos colocar que está no Itaú.

  2. Cartão de Crédito: No Nubank.

  3. Financiamento da Casa: Também no Itaú.

  4. Financiamento do Carro: No Bradesco (porque lá a taxa estava melhor!).

  5. Empréstimo Familiar: Com o "Tio".


Agora, vamos preencher as Taxas de Juros. Para isso, você precisa entrar em contato com seu banco, consultar seu contrato ou a fatura do cartão de crédito. Para o cheque especial e cartão, você pode pesquisar no site do Banco Central, que mostra as taxas médias de mercado. Por exemplo, o Itaú para cheque especial pode estar em 8,14% ao mês. Para o Nubank (cartão de crédito rotativo), pode ser 13,07% ao mês. Para financiamento da casa, vamos usar 2% ao mês, e para o carro, 1,80% ao mês. E com o "Tio", que é gente boa demais, vamos colocar 0% de juros!


Agora, a Taxa de Juros (ao Ano). Aqui entra a parte dos juros compostos, que é crucial para entender o problema da dívida (e a solução nos investimentos). Se você tem 8,14% ao mês, não é só multiplicar por 12. Os juros incidem sobre juros. Usando a fórmula de juros compostos, 8,14% ao mês vira 155% ao ano! Para o cartão de crédito, 13,07% ao mês vira 336,83% ao ano! Percebem o absurdo? O financiamento da casa (2% ao mês) vira 26,82% ao ano, e o do carro (1,80% ao mês) vira 23,87% ao ano. O do Tio, claro, continua 0%.


Em Valor da Prestação, para cheque especial e cartão de crédito é mais difícil ter um valor exato, pois depende do quanto você gira. Mas vamos simular:

  • Cheque Especial: digamos que você está com R$ 1.000 negativos.

  • Cartão de Crédito: R$ 800 a pagar.

  • Financiamento da Casa: Parcela de R$ 2.000.

  • Financiamento do Carro: Parcela de R$ 500.

  • Empréstimo Familiar: No momento, R$ 0 de parcela fixa.


Em Valor em Atraso e Total Contratado:

  • No cheque especial, digamos que você esteja com R$ 1.000 negativos, e esse é o valor total a pagar no momento.

  • Para o empréstimo familiar, você pegou R$ 5.000, mas está com R$ 3.000 em atraso, e ainda faltam R$ 2.000 para quitar.


Agora, a primeira coisa que você vai fazer é usar a ferramenta de Filtro na sua planilha. Aplique um filtro na coluna de Taxa de Juros (ao Ano) e ordene da maior para a menor taxa.

Por quê? Porque sua prioridade sempre deve ser pagar a dívida mais cara primeiro. O empréstimo com o Tio, mesmo que você perca a confiança dele, não vai te gerar um ônus financeiro maior do que o que você já contratou. Já o cartão de crédito, com juros de 336% ao ano, está te consumindo vivo!


Então, no nosso exemplo, a ordem de prioridade seria:

  1. Cartão de Crédito: (336,83% ao ano)

  2. Cheque Especial: (155% ao ano)

  3. Financiamento da Casa: (26,82% ao ano)

  4. Financiamento do Carro: (23,87% ao ano)

  5. Empréstimo Familiar: (0% ao ano)


Com isso, você conseguiu mapear que tem cinco dívidas, em quais bancos, quais os juros mensais e anuais, e o valor da prestação.


Simulando o impacto dos juros compostos: Vamos simular o cheque especial de R$ 1.000 com 8,14% de juros ao mês.

  • No Mês 1, se você não pagar, o valor de R$ 1.000 vai virar R$ 1.081,40.

  • No Mês 2, os 8,14% incidirão sobre os R$ 1.081,40, e a dívida aumentará ainda mais.

  • Isso vira uma bola de neve. A dívida aumenta exponencialmente se você não conseguir quitá-la.


O mais importante é ter essa noção da foto da sua vida financeira. Assim como fizemos com receitas e despesas, a parte delicada das dívidas também precisa ser encarada. Entrem em contato com bancos e casas de financiamento, tenham a noção dos juros que vocês pagam e busquem renegociar, sempre buscando juros mais baixos.


Mas o mais importante do que resolver o problema atual é, depois de resolvê-lo, refazer seu perfil de consumo. Você precisa abandonar hábitos disfuncionais de só consumir e começar a organizar sua vida para consumir de forma consciente e poupar. É essa a rota da independência financeira.


Sei que essa aula pode ser um pouco incômoda, mas precisamos passar por isso para chegar aos nossos primeiros R$ 10.000, depois R$ 50.000, R$ 100.000, até R$ 1.000.000. Queremos que o dinheiro trabalhe para a gente de forma tranquila e que tenhamos saúde mental através da saúde financeira.


Até a próxima aula!



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