Carta de Abril de 2025
- Felipe Picanço
- 8 de mai.
- 7 min de leitura
Atualizado: 9 de mai.
Caro leitor,
O mês de abril de 2025 veio forte nas quedas nos primeiros quinze dias e trouxe melhoras nos quinze dias finais. Nada melhor do que isso para representar a volatilidade dos preços.
Estados Unidos
No quarto mês do ano consolidou-se um cenário de deterioração nos indicadores econômicos, em meio ao aprofundamento da guerra comercial iniciada pelo atual governo. Durante o mês tivemos o “Dia da Libertação”, onde as tarifas para cada país foi divulgada, tivemos o anúncio da pausa de 90 dias nas tarifas para os países que se colocaram para negociação, tivemos a consolidação do aumento médio das tarifas de importação para cerca de 23%, com alíquotas específicas como 145% sobre produtos chineses e alguns outros micro acontecimentos que vêm incomodando o mercado e que provocou forte incerteza sobre a duração e os efeitos dessa nova política.
Sabemos também que indicadores soltos podem não representar sozinhos a realidade, mas em abril, alguns dados começaram a ser divulgados e seus resultados, aquém da expectativa, podem ser correlacionados ao início do processo de desaceleração americana, já que a retaliação internacional é uma possibilidade concreta, com impactos previstos sobre cadeias produtivas e o abastecimento interno. No mês, vimos que o movimento marítimo entre Ásia e EUA registrou queda expressiva, com previsão de desembarque de contêineres chineses caindo 45% em relação a abril de 2024, as vendas de caminhões atingiram o nível mais baixo desde a pandemia, o número de casas novas não vendidas subiu ao maior patamar desde 2009 e o índice de atividade industrial de Dallas caiu ao menor nível desde maio de 2020, o custo de produção pode subir entre 5% e 15% para as empresas americanas e no lado dos consumidores, houve uma redução nas viagens internacionais e em gastos com turismo. Esses dados são suportados por relatórios do Financial Times e Goldman Sachs.
Com relação ao crescimento da economia, o PIB do primeiro trimestre recuou 0,3%, sendo a primeira queda desde 2022, frustrando as expectativas de crescimento e gerando um alerta a ser considerado na análise de cenários econômicos para os investidores. O Federal Reserve enfrenta o dilema de uma inflação inquieta e com atividade em desaceleração, em meio à pressão política, inclusive com rumores sobre possível demissão do presidente do Fed, já que há um embate entre aumentar os juros para conter a inflação que virá da guerra comercial, que já conversamos na últimas cartas, ou reduzir juros, já que as medidas tarifárias que estão sendo adotadas podem enfraquecer a economia, e nesse momento, juros baixos podem ser um contrapeso para que os EUA continue girando em números que não os tirem de sua soberania.
O FED sabe que vêm chegando uma desaceleração econômica à frente, mas ainda não tem dados suficientes para agir, e isso só deve acontecer após o processo de negociação das tarifas, que nas melhor das hipóteses, já deve ter ocorrido até setembro de 2025, mês em que se espera que tenha início o ciclo de corte de juros.
Considerando alguns principais indicadores de mercado, vimos o S&P 500, em dólar, recuar -0,76% em abril, acumulando queda de -5,31% no ano, enquanto o Nasdaq subiu 0,85% no mês mas acumula queda de -9,65% em 2025. O índice VIX, termômetro da aversão ao risco, disparou 10,86% no mês e já avança 42,36% no ano. Dentre o mais importante de todos, o dólar, medido pelo Índice do Dólar Americano (DXY), começa a perder força, não somente pela fragilidade fiscal de déficit comercial com outros países, mas pela desconfiança global, em um movimento que os parceiros que sempre enxergaram o dólar e ativos de risco americanos como porto seguro, pode começar a procurar outras alternativas por cautela.
Assim, até o momento, os desdobramentos dessa guerra comercial montaram um cenário raro para o mercado americano: ações em queda, taxas do tesouro americano em alta e dólar em queda.
Europa
Na esteira da política comercial americana, a União Europeia se tornou alvo direto das tarifas impostas, com sobretaxa média de 20%. As medidas devem pressionar os custos de exportação e elevar os preços de bens importados nos países do bloco, gerando riscos inflacionários adicionais.
Apesar do ambiente de incerteza, o crescimento do PIB no primeiro trimestre de 2025 foi de 0,4% em comparação ao primeiro trimestre de 2024, e ficando acima do esperado pelo mercado, de 0,2%. A Alemanha cresceu 0,2%, e apesar da correlação ainda não poder ser identificada diretamente às tarifas, é possível que o adiantamento de exportações, num esforço de antecipação para não incorrer custos tenha beneficiado o país. A principal preocupação é que a guerra comercial gere uma redução da demanda global, devido ao adiamento do consumo das famílias e decisões de investimentos, além da possibilidade de impacto nos preços de produtos como itens farmacêuticos, automóveis e maquinários, que tem um bom percentual de exportação para os EUA, e podem gerar deflação.
Na política monetária, o banco central europeu optou por manter o ciclo de cortes com uma redução de 0,25%, levando a taxa de juros para 2,25%. O bloco europeu é mais um que corretamente afirma ter dependência de dados diante do novo choque de comércio para que possa fazer mudanças na tomada de decisão de juros. Ainda assim, é possível um novo corte de 0,25% na reunião de junho, atingindo 2%, uma taxa que nem aquece e nem freia a economia.
As bolsas europeias, por ora, reagiram de forma mais resiliente. O MSCI Europe teve alta de 3,81% no mês, acumulando ganho de 14,04% no ano.
China
A China foi o país mais atingido pelas novas tarifas americanas, com alíquotas de até 145% em alguns setores estratégicos. O governo chinês, por ora, tem adotado postura cautelosa, priorizando a estabilidade macroeconômica e o estímulo à demanda interna, que apesar do caos, foi favorecida pela antecipação de importações por parte de empresas norte-americanas, antes da implementação das tarifas anunciadas. Apesar do desempenho positivo no primeiro trimestre, dentro do cenário de possibilidade, é bem provável uma desaceleração da atividade, em especial a partir do segundo semestre, quando os reais efeitos começam a se materializar.
Diante do atual cenário, é possível que a principal ferramenta do governo chinês seja colocar em prática nos próximos meses o pacote de estímulos de 2 trilhões na moeda local, aprovado pelo Congresso Nacional do Povo, com o objetivo de reduzir os impactos tarifários e sustentar o consumo doméstico.
De forma geral, os indicadores de crescimento permanecem moderados, com desempenho relativamente estável nos setores domésticos. O MSCI China caiu -4,55% em abril, embora ainda registre valorização de 9,44% no acumulado de 2025.
Brasil
O Banco Central, no entanto, pode estar perto do fim do ciclo de alta da Selic, atualmente em 14,25% ao ano e com possível elevação de 0,5% na reunião de 07 de maio, levando a taxa a 14,75% ao ano. O conjunto dos indicadores, de atividade econômica e do mercado de trabalho, ainda está mostrando movimentações que não dão conforto para o fim do ciclo, além disso, nas divulgações mais recentes, a inflação manteve-se acima da meta mas com crescimento menor, como se em uma estrada estivessem seguindo para a mesma direção mas agora com uma velocidade mais baixa.
As expectativas de inflação para 2025 e 2026 apuradas pela pesquisa Focus permanecem em valores acima da meta, situando-se em 5,5% e 4,5%, respectivamente. A inflação de abril deve vir levemente abaixo da inflação de março, o que pode indicar uma redução do aumento de preços, mas que precisam ser avaliados dentro do contexto de efeitos sazonais, ainda assim, para 2025, a inflação ficará fora do teto da meta do banco central, de 4,5% ao ano.
A economia segue sustentada por fatores como o bom desempenho da agropecuária, o reajuste real do salário-mínimo e o impulso fiscal ainda vigente, ainda assim, o crescimento da economia segue incerto, pois em 2024 foi sustentado pela ótica do consumo da famílias, que não está apresentando a mesma velocidade ao ponto de manter o crescimento da economia acima de 3% para 2025. O assunto que tem balizado as discussões sobre meta de inflação, taxa de juros e resultados fiscais, é que o conjunto de políticas de crédito do governo, representadas pela liberação do saque-aniversário no FGTS para pessoas que foram demitidas entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2025; o criação do crédito consignado CLT; o Vale-gás; e o Pé-de-meia, colocam mais dinheiro disponível na mão do consumidor, que acaba virando um entrave para convergência da inflação em direção à meta, por gerar pressão na demanda. Na parte fiscal, a parte menos ruim foi que o governo propôs uma meta de superávit primário de 0,25% do PIB para 2026, que está dentro do estabelecido pelo Arcabouço Fiscal, que permite desvios de até 0,25% para cima ou para baixo.
O Brasil, apesar de ter sido incluído no pacote tarifário dos EUA com uma alíquota de 10%, sofreu impactos mais moderados do que outras economias emergentes, já que o comércio internacional como percentual do PIB é de 36%, permitindo que esse distanciamento afete menos os ativos de risco. Isso contribuiu inclusive para um ambiente de menor aversão a risco no mercado local, refletido na valorização do Ibovespa, que subiu 3,69% em abril e acumula 12,29% no ano. A Bolsa de Valores, medida pelo IBOV, sofreu bastante na primeira quinzena, chegando a cair quase -5%, com saída forte de capital estrangeiro, no entanto, após arrefecimento da guerra comercial, na segunda quinzena a alta foi de quase 9%, com o mês fechando então com alta de 3,69% e retorno do capital estrangeiro, cujo fluxo faz preço. Esse forte sobe e desce foi visto pelo indicador de volatilidade histórica, que do dia 02 de abril até o fim do mês, subiu 30%.
Por fim, os títulos públicos indexados à inflação (NTN-B's) também apresentaram desempenho positivo, com altas de 2,56% para títulos de 2 anos e 2,05% para títulos de 10 anos. O CDI ficou em 1,06% e o IMA-B em 2,09%. O dólar comercial caiu 0,60% no mês e uma desvalorização de -8,22% em 2025.
Até a próxima,
Felipe Picanço, CGA

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